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Ansiedade aumenta pós-pandemia e se torna um problema social

por Camila Pinheiro | Orientação: Larissa Zuim

Cerca de 18,6 milhões de pessoas sofrem de ansiedade somente no Brasil, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2019. Os dados colocam o país no topo do ranking mundial. Este cenário se intensificou desde a pandemia da Covid-19 de 2020. Uma pesquisa liderada pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) aponta cenários elevados de depressão (19%) e ansiedade (30%). O quadro de 2022 é superior à realidade pré-pandêmica, que eram de 4,2% e 4,7%, respectivamente.

No primeiro ano da pandemia, a prevalência global de ansiedade e depressão aumentou 25%, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). A psicóloga clínica Érica Mopes atende há 2 anos e atende muitos pacientes diagnosticados e comenta sobre esse aumento exponencial durante a pandemia:

Houve um aumento de casos de ansiedade, que pode ser relacionado a pandemia, principalmente no período anterior a vacinação, pois a alta transmissibilidade, as mortes e o confinamento a que todos foram submetidos sem a certeza de quando haveria um retorno a rotina gera anseios, isso sem contar em como o confinamento afetou as relações intra-familiares, em que o recolhimento fez aumentar os conflitos”, explica a psicóloga.

Às vezes, o paciente chega ao consultório já sabendo que tem ansiedade, mas a maioria deles não consegue identificar que o que sentem faz parte de um grau desse transtorno. Sintomas como pensamento acelerado, fadiga, dor no peito, falta de ar e dores nas costas são sintomas que não são associados à ansiedade por desconhecimento. “Não há um padrão do que pode gerar a ansiedade, pois pode ser algo que pode parecer banal para outros, mas é de extrema importância para o sujeito”, afirma Mopes.

A análise detalhada do profissional é fundamental para diagnóstico correto e tratamento. Conhecer as razões pelas quais o paciente passa por isso vai trazer o alívio dos sintomas, já que pode ser também uma fase. Quando isso traz incômodos e interfere na vida da pessoa, a situação precisa ser trabalhada na psicoterapia.

A psicóloga fala também sobre o estado das pessoas que procuram ajuda. “Muitas pessoas quando vão à clínica falam das sensações angustiantes e de não conseguirem parar de pensar em determinadas situações, gerando até sensações físicas, como hiperventilação, aperto no peito, mãos suadas e em casos mais sérios até mesmo a sensação de que irão morrer”, esclarece.

Segundo ela, os motivos que envolvem o surgimento da ansiedade são diversos, variando de pessoa para pessoa.

Não há um padrão do que pode gerar a ansiedade, pois pode ser algo que pode parecer banal para outros, mas é de extrema importância para o sujeito. Por exemplo, quando uma pessoa com ansiedade se preocupa excessivamente com seu futuro, com algo normal na vida do ser humano, como o diploma universitário. Um ansioso ele faz constantemente a contagem de quanto tempo falta para esse momento chegar, demonstra preocupação excessiva com as atividades que deve realizar para que isso não atrapalhe, sendo que alguém que não tem o transtorno, leva como algo normal. Se dedica, faz o que deve fazer, e fica tranquilo. Para um ansioso, mesmo que a atividade esteja concluída, ele pensa nas próximas. A mente nunca descansa”, evidencia Érica Mopes.

A social media Caroline Aparecida, que tem o diagnóstico do transtorno há pouco mais de um ano, relata como foi o caminho de procurar ajuda até receber o diagnóstico. Ela conta um pouco sobre como é sua rotina com a ansiedade.

Eu tinha cerca de 19 anos, morava sozinha e comecei a me sentir mal, azia na região do peito, batimentos cardíacos acelerados e formigamento na cabeça e braços. De imediato já pensei que estava infartando, saí de casa e fui para o shopping, pois sabia que se eu passasse mal por lá, teriam bombeiros e seguranças para me ajudar. Anos depois, após iniciar o tratamento, percebi que aquele episódio havia sido a minha primeira grande crise de ansiedade. Após saber que eram sintomas de ansiedade, me assustou muito perceber que os sintomas sempre fizeram parte da minha vida, como a insônia, que tive desde criança, recuar ações pensando em mil maneiras de dar errado, a procrastinação (que é causada também pelo TDAH – Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade)”, revela a profissional.

A saúde mental é um fator bio-psico-social, não podendo ser isolada das condições efetivas de vida, trabalho e sociabilidade do indivíduo. Quando não se tem disposição mental, as chances de se perder essas condições tornam-se maiores. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), cerca de 12 milhões de pessoas perderam seus empregos devido à depressão e à ansiedade.

A OIT recomenda que o trabalho seja um potencial fator de promoção da saúde mental, por proporcionar estrutura temporal, contato social, senso de esforço e propósito coletivos, identidade social e atividade regular, fundamental na organização da rotina. Mas aponta que são necessários cuidados, pois pode contribuir para o adoecimento psíquico, com condições como “sobrecarga de trabalho, falta de instruções claras, prazos irrealistas, não-participação nas tomadas de decisão, insegurança no emprego, condições de trabalho em isolamento, vigilância e arranjos inadequados de cuidado com filhos pequenos”, exemplos de condições vivenciadas por muitos trabalhadores, principalmente mulheres, durante o trabalho remoto por conta da pandemia da Covid-19.

Mas para que seja promovida a saúde mental, são necessários não apenas os cuidados prévios para um ambiente saudável, mas também, ao se apresentarem sintomas de um possível transtorno, que seja feito o incentivo à busca pelo diagnóstico. “O diagnóstico de fato leva um período de tempo, pois mesmo que a pessoa tenha essa impressão, é importante passar por um processo de avaliação psicológica, a qual tem diversas fases como entrevista, anamnese e caso seja necessário a aplicação de testes para assim poder fazer o diagnóstico”, explica a psicóloga Érica Mopes.

Com o diagnóstico em mãos, Caroline fala que foi importante compreender o que estava vivendo, buscar ter qualidade de vida e restabelecer um bom convívio social. “Ter um diagnóstico foi bom, pois a informação veio com o passar do tempo com a terapia, como tenho os sintomas por toda a vida, saber que isso não é culpa minha, e que isso é tratável, me trouxe tranquilidade”, diz. Ainda assim, é importante continuar com os tratamentos.

Às vezes há muito desânimo, os pensamentos negativos me paralisam bastante, mas já consigo identificar quando estou em crise, consigo explicar para as pessoas o porquê da ausência, e entender o meu próprio corpo, quando ele pede paz, calma, desligamento. Hoje as crises são menores e em momentos específicos”, revela a social media.

Outro ponto importante é a compreensão, que nem sempre existe nos círculos familiares, de amigos, no trabalho. Alguns fatores, como crenças religiosas e a falta de diálogo em casa impactam negativamente na identificação do transtorno e na busca por tratamento.

“Durante a minha jornada profissional, por exemplo, tive gestores que, após o início do tratamento, adaptaram a minha rotina de trabalho, como alternância entre o presencial e o home office, adequaram ferramentas de organização e aumentaram o prazo de entrega de demandas. Meu companheiro também compreende, e está junto comigo desde o início do tratamento, então, ele tem muita paciência, e também é quem me puxa pra ir ao médico e realizar as atividades do dia, devido a procrastinação. Mas para meus pais e irmãos eu não me sinto preparada para falar no assunto, pois são muito apegados à crença religiosa e não concordam que eu procure acompanhamento psiquiátrico, então eles mesmos evitam o assunto”, explica Carline.

Segundo a psicóloga Mopes, em algumas situações, a busca religiosa, em vez de aliviar o sofrimento, piora o quadro clínico, com comportamento de enfrentamento negativo e uso inadequado dos serviços de saúde. Entre os aspectos negativos, poderiam ser mencionados o fanatismo e tradicionalismo opressivo. “Determinadas religiões podem se tornar rígidas e inflexíveis, estando associadas ao pensamento mágico e de resistência. Isso pode dificultar o tratamento do paciente, se é feita a proibição da psicoterapia ou do uso de medicação”, defende.

A busca por ajuda profissional é fundamental quando sintomas como insônia, irritabilidade e desânimo persistem por um longo tempo. O tratamento psicoterápico, em geral, busca fortalecer mecanismos de adaptação do corpo que está fragilizado, mas em alguns casos, o auxílio de medicação se faz necessário.

Morcegada

Site jornalístico supervisionado pelo professor e jornalista Allysson Viana Martins, vinculado ao Departamento de Jornalismo da Universidade Federal de Rondônia (UNIR)

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