Migração de japoneses influenciam cultura rondoniense
Associação ajuda na divulgação da cultura japonesa em Porto Velho
Por Alana Santos | Orientação: Larissa Zuim
Os primeiros imigrantes japoneses no Brasil deixaram suas terras natais há 114 anos com um propósito, oferecer mais qualidade de vida às suas famílias. A viagem durou 51 dias e o navio Kasato Maru, com 781 japoneses a bordo, saiu de Kobe, no Japão, passou por Singapura e Cidade do Cabo até desembarcar no Porto de Santos, São Paulo, em 18 de junho de 1908. A embarcação não transportava somente pessoas de uma outra nação, mas também sonhos, objetivos, medos e esperança.

Com a abolição da escravidão duas décadas antes, o Brasil inseriu imigrantes para substituir a mão de obra das lavouras de café, mas os japoneses não encontraram boas condições de vida no país como eles esperavam. Isso fez com que a maioria das famílias fugiram das fazendas cafeeiras e migraram para outros estados, como o Mato Grosso do Sul.
Segundo o livro O Japão sob múltiplos olhares, de Michele de Sá e Aldenor Ferreira, essa foi uma das maiores movimentações humanas já registradas, um fenômeno que revelou a capacidade de resistência e adaptabilidade dos seres humanos.
Após o navio Kasato Maru, outros vieram para o Brasil trazendo japoneses, e foi em julho de 1958 que 29 famílias chegaram a Rondônia, vindos de Belém, onde o navio África Maru desembarcou de uma viagem de 40 dias. Em Rondônia, os imigrantes criaram uma colônia chamada 13 de setembro, que ficava nas redondezas de Porto Velho. Esses pioneiros japoneses faziam cultivo de seringueiras para extração do látex, a criação de aves e o cultivo de verduras e hortaliças, para consumo e venda.

Mity Furukawa, de 69 anos, é uma issei, 1º geração de os japoneses que imigraram para o Brasil, sendo assim, nascidos no Japão. Foi uma das imigrantes que vieram para o território brasileiro através do navio África Maru. Ela é da família Eichi Matsuzaki e tinha apenas 1 ano de idade quando desembarcou em Rondônia, em 07 de julho de 1954, junto com seus pais e 2 irmãos. Furukawa conta que, durante a sua infância e adolescência, ela e sua família viveram na colônia de japoneses 13 de setembro em Porto Velho.
No começo, as famílias da colônia tinham pouca ajuda dos locais e do estado, mas todos os chefes de família conseguiram um caminhão para levar os seus cultivos, como verduras, frutas e ovos para vender na cidade. Furukawa relembra momentos muitos felizes vividos por ela, mesmo a família sendo muito pobre na época. O seu pai ia para a cidade no caminhão do governo com a produção de sua casa.
Muitos descendentes japoneses continuam no ramo da agricultura no Brasil. Segundo o G1, os imigrantes tiveram grande influência na implementação de um cooperativismo baseado em uma produção coletiva, por meio do qual, os imigrantes ajudaram a expandir a agricultura para todo o Brasil e a lançar novas hortaliças, frutas e legumes. Essa cultura impacta também Rondônia, que atualmente é referência de agricultura e agronegócio no país.
De acordo com a Mity Furukawa, sentiu muito choque cultural em relação à escola, quando iniciou os estudos na Escola Marechal Deodoro da Fonseca. Ela conta que no começo era difícil se comunicar, mas os erros não a impediram de se enturmar com seus colegas e amigos. Na colônia, as famílias não misturavam a cultura brasileira com a japonesa, então, sempre faziam comemorações do calendário japonês e sabiam separar as duas culturas, respeitando também as comemorações brasileiras.
Hoje, Mity Furukawa é aposentada, tem uma filha que estuda em São Paulo e ainda mora em Porto Velho com seus irmãos.
ASSOCIAÇÃO CULTURAL NIPO BRASILEIRA DE RONDÔNIA
Após 68 anos, desde que os primeiros colonos chegaram ao estado, um grupo de descendentes migrantes de outros estados sentiram a necessidade de um espaço para confraternizar, já que a colônia 13 de setembro era mais privada para as famílias que moravam naquele ambiente. Por isso, para integrar esses descendentes, decidiram criar o Nikkey Club em um terreno doado pela prefeitura de Porto Velho.
De acordo com atual presidente da associação, Mariela Tamada, foi naquela época que começou a escolinha chamada Voluntários da Jica, da Agência de Cooperação Internacional do Japão, com professores nativos para ensinar o idioma japonês aos associados.

Tamada conta que chegou em Porto Velho em 2006. Após algumas dificuldades, principalmente financeiras, que a associação sofreu em 2010, ela assumiu a presidência para dar continuidade ao trabalho e sugeriu a mudança de nome para Associação Cultural Nipo Brasileira de Rondônia (Nikkey), sendo acatada pela organização em 2012.
A presidente da associação destaca que o objetivo é promover a cultura japonesa através da educação, práticas esportivas, amparo social, atividades recreativas e cooperação com as instituições culturais do estado. Mariela Tamada reforça que o Nikkey é a única organização da cidade que ensina o idioma japonês, e tem muito a contribuir para a comunidade local.
Por efeito da associação, muitas famílias descendentes de japoneses em Porto Velho têm um lugar onde podem se reunir, confraternizar com seus familiares e amigos, tanto japoneses quanto brasileiros. Em 2022, a associação completou 28 anos de funcionamento e oferece aulas de nihongo (japonês), taiko, yosakoi soran e aikido (artes marciais).
Miguel Vilela, de 27 anos, conta que, apesar de não ter descendência japonesa, estudou japonês no Nikkey, de 2011 a 2015. Ainda assim, ele sempre esteve inserido na cultura japonesa.
Meu primeiro contato com a cultura japonesa foi antes mesmo de saber o que era cultura japonesa. Acho que os desenhos da cultura pop já influenciavam bastante, como Dragon Ball, Cavaleiros do Zodíaco. Esses desenhos foram meu primeiro contato”, diz Miguel Vilela.
Segundo Miguel, além das aulas de japonês, era aluno de taiko e soran no período de 2011 a 2020, e pretende retornar em 2023 após terminar a faculdade. Ele participou de muitas apresentações com a turma de taiko e de vários eventos que a associação oferecia. Em 2016, foi passar férias de 1 mês no Japão e relembra de sua experiência incrível no país. “Mudou muito pra mim, principalmente por entender que a cultura japonesa não é só anime, samurai, e essas coisas que Hollywood vende pra gente, né?”, relembra.
Mas pequenas coisas que fazem parte da cultura e que não são tão levadas a sério porque é o que a gente observa de fora né? Então eu tive um contato melhor e consigo reconhecer um pouco o que é a cultura japonesa, mas tô longe de saber 100%, porém mudou minha vida”, conta Miguel sobre sua percepção depois que entrou para a associação.
Na opinião dele, o impacto da cultura japonesa no nosso estado ainda é pequeno em comparação a outros estados do país como São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul. Ainda assim, “impacta muito, pois é um pouquinho do Japão que tá aqui, ou seja, a maioria dos eventos relacionados a cultura japonesa em geral, não só cultura pop, é gerenciado pelo Nikkey. Eles trazem um pouco desses eventos, comidas tradicionais, além de sushi e apresentações culturais. Dessa forma, o espalhamento dessa cultura é efetivo, saindo um pouco do industrial, trazendo para o familiar, que ainda deixa a cultura do Japão vivo aqui”, complementa.
De acordo com a Embaixada do Japão no Brasil, estima-se que aproximadamente 2 milhões de japoneses e descendentes vivem no Brasil atualmente, sendo a maior população fora do Japão.

A cultura japonesa tem um alto impacto na sociedade brasileira, não somente por serem a maior população fora do Japão, mas também pelas trocas culturais que essas duas nações fizeram e ainda fazem no país. Mesmo que em Rondônia essa cultura não seja tão disseminada quanto nas outras cidades, ainda assim, há uma forte presença e registro dos imigrantes e do quanto eles contribuíram e contribuem nos aspectos socioeconômicos e culturais do estado.



